Você sabe lidar com as emoções dos seus pequenos?

Dicas de como lidar com as birras da criança, do livro Limites - Como lidar com os pequenos? , autora Maria Teixeira.

     Algumas crianças com idades ente 2 e 5 anos parecem usar as birras como uma ameaça, ou uma ferramenta para conseguirem o que querem. Isso ocorre porque em algum momento perceberam que isso é eficaz. Quando as crianças resolvem fazer birras, começam a espernear, se jogam no chão, emburram e fazem malcriações, e, a vontade da maioria dos pais é de sair correndo. Alguns se desesperam e, a vontade é de chorar também ou se esconderem. É certo que as crianças menores podem usar as birras para dizer o que as palavras ainda não podem dizer. Mas, existem algumas ideias que podem acalmar as crianças e evitar que os pais percam o controle da situação. As birras são terríveis, irritantes, mas é uma saída, uma descoberta das crianças e, faz parte da realidade da infância de muitas crianças, simplesmente, porque elas já descobriram que dessa forma os pais cedem aos seus caprichos.  Podemos pensar em algumas estratégias simples que acabam com as birras e criam a cooperação na criança. Claro, a criança tem de ser educada para saber que birra não é a solução dos problemas, mas, até que ela entenda, algumas estratégias podem ser seguidas e aplicadas no momento da birra, e, podem ajudar muito.

1. Deixe a criança extravasar a sua raiva

      Algumas vezes a criança só precisa extravasar sua raiva e frustação que ainda não aprendeu a controlar. Em casa, deixe-o (a) por alguns minutos só. Depois, se aproxime e pergunte: - Já passou? Agora, podemos conversar?  e, aproveite a oportunidade para  ensiná-la como se consegue as coisas e, procure traduzir as suas ações. Se ocorrer em público, não espere ela/ele chamar a atenção de todos à volta;  leve-o(a) para um lugar reservado para que tenha um pouco de privacidade, deixe-a extravasar ali;  se afaste; não fique pegando ou tentando controla-la no momento de raiva. Sabe aquele momento em que se precisa de uns dois minutos para voltar a si? A criança não é diferente do adulto, às vezes, também precisa disso e, algumas, lidam com sua raiva ou frustração fazendo birra. Essa estratégia ajuda a criança a aprender a se expressar de uma forma não destrutiva e começar a ter ideia do que é autocontrole.

2. Pense em alguma forma de tirá-la do foco

     No caso da criança muito pequena, enquanto ela estiver tendo aquele acesso de birra, pense em alguma distração que a tire do foco daquele momento. Pode ser um brinquedo que esteja ao alcance.  Já a criança maior, chame-a a atenção para algo ao redor ou sugestão de um novo passeio. Se estiver no supermercado, por exemplo, peça para ela escolher o sabor do sorvete para a sobremesa. As crianças se concentram em um só assunto por pouco tempo, por isso, normalmente são fáceis de distrair. Isso ajuda a tirar a atenção da birra. Se não resolver, volte à estratégia 1.

3. Escute o que ela tem a dizer 

       Dialogar é diferente de conversar apenas para ajustar coisas do dia-a-dia. Após aquele momento de privacidade, tente ouvir o que está frustrando seu filho (a), ele (a) pode ter muito a dizer sobre aquele momento de raiva. Lembre-se que as crianças menores têm um vocabulário limitado para expressar seus sentimentos e podem usar a birra para dizer o que as palavras ainda não podem traduzir.  Antes, você precisa daquele momento de recuperação do seu controle; tome uma água e respire fundo. Use um tom de voz calmo, mas que passe confiança; não ameace. Seu filho vai perceber que a birra não está lhe atingindo e isso vai também ajudar você a manter a calma. Se a sua voz estiver alterada, o efeito vai ser o inverso: todos vão ficar alterados e, um clima de descontrole será instalado. Gritar, nem pensar. Muitos pais ficam envergonhados e com raiva da criança quando a birra ocorre em público, mas, a forma como você vai agir diante da birra é o que importa. Se os pais agem com calma e autocontrole todos vão ver que são bons pais e, que estão cuidando para educar seu filho.  O diálogo vai mostrar à criança que tanto a criança como o adulto, algumas vezes, se sente frustrados com alguma situação, mas, que é preciso saber lidar com elas.

4. Acolha o seu filho e dê carinho

       Fazer um carinho, geralmente é a última coisa que um pai ou uma mãe pensam em fazer após ter passado por um momento de estresse com um filho. Todos estão irritados, alterados, mas, após aquele momento em que a criança extravasou a sua frustração em sua privacidade, esse é um gesto que pode ajudar muito a criança a se sentir segura e acolhida após um acesso de raiva. O abraço tem de ser firme, e o melhor é que o adulto não fale nada enquanto abraça. Depois, ofereça alguma coisa para a criança beber ou comer. Faça um lanche gostoso e saudável com ela. É muito comum na criança pequena a causa da birra ou choro ser: fome, frio, calor ou sono (algum desconforto) e, não o interesse por isso ou aquilo.  No caso da compra, as vezes, os pais compram e, depois, a criança nem liga para o objeto.  O acolhimento pode funcionar tanto para a criança menor como a maior. Outra boa ideia, no caso da criança pequena  é levá-la para o quarto e coloca-la para tirar uma soneca após o estresse. Ela vai acordar mais calma e disposta e, muitas, nem vão lembrar-se do ocorrido. 

 

5.  Não valorize demais o ocorrido

  Ficar lembrando a criança ou o adolescente o acontecido não vai ajudar em nada, pelo contrário, vai fortalecer nela(e) esse sentimento egocêntrico e, sempre que quiser ser o centro do universo, chamar atenção, terá esse trunfo guardado.                      

     Os pais das gerações anteriores, devido à preocupação de ter de estabelecer “limites” sem ser radical, nem permissivo, acabaram agindo por pura incompetência, e falharam. Hoje, há a preocupação de se achar a ”justa medida” de que defende Aristóteles, filósofo grego. A educação tradicional foi radical demais; a “liberal”, também fracassou; a atual tem fracassado por medo de frustrar os desejos dos filhos.

    A escola, principalmente a pública, enquanto instituição educativa continua tradicional demais, com suas regras, normas e limites rígidos e, cobranças obsessivas do silêncio.  Deve haver um consenso de que há necessidade de um novo olhar de novas práticas educativas. 

  As queixas surgem, principalmente, na iniciação escolar, por volta dos 6 e 7 anos.  Esta é a fase em que a criança começa a mostrar as suas “inscrições” -, a estrutura que foi adquirida na família.  Nesta fase, ela já tem a percepção das coisas, já faz seus pré-julgamentos e, é argumentativa.           A criança vai para a escola com a formação do pensamento; com seu jeito próprio de agir e, com seus gostos. Isso quer dizer que ela se movimenta dentro do que foi permitido até, então.

    A escola é um espaço social, e como qualquer espaço social, há leis, normas e regras. A criança chega e vai se organizando, se acomodando, se apropriando dos objetos, das informações e, se apresentado enquanto sujeito. Ela vai aos poucos extraindo algo dos vínculos com os professores, colegas.

   Neste sentido, a criança já tem a percepção das coisas e, as informações podem ser significativas e, se transformarem em conhecimento ou não.   A efetivação do conhecimento é desejo do próprio aluno.   Quero adiantar que as imposições nunca são bem vindas. Os adultos muitas vezes, impõem a sua vontade à criança por acreditar que têm o domínio sobre o seu desejo. Não se iluda -, Não temos o domínio sobre o desejo do outro, mesmo que esse outro seja nosso filho (a).  

     É certo que o lugar de pai severo que impõe normas, que as cumpre e faz cumprir, faz parte de um passado em que se descobriu que a repressão levava a problemas emocionais.  Naquele contexto, considerava-se a criança sem desejos, sem liberdade de expressão.

   Os pais do mundo moderno, mais cautelosos passaram a ter preocupação no trato com os pequenos.  Tudo o que queriam era “Educar sem traumas”.            É perfeitamente possível educar estabelecendo limites e, “sem traumas”; sabendo dizer um “Não” consistente, em nome de uma boa educação.                    As frustrações são formadoras e, tornam o sujeito conhecedor de seus limites.  Frustrar alguns dos desejos da criança não é ser mau, é disciplinar, é permitir que ela se desenvolva e deixe de ser egocêntrica.

   Devido à maior liberdade de expressão das crianças; maior atenção dos pais quanto à questão de estabelecer limites sem imposição, o desejo do filho é o que prevalece. 

    Assistimos nos shoppings, nos restaurantes, verdadeiros “shows” de crianças que se movimentam nos espaços sociais da forma como foi permitido na família -, prevalecendo a sua vontade.

    O que temos assistido com muita frequência é um exemplo de “Educação sem limites”. Todos percebem que ali há uma inversão de papeis. A educação baseada no “tudo pode”; a preocupação exagerada de “Educar sem traumas” está traumática para os pais.  Alguns professores pensam até mesmo em desistir da profissão, outros, adoeceram. Isso quer dizer, que o medo de não frustrar vem formando cidadãos sem parâmetros do que é permitido, sem respeito ao outro.  

   Não podemos subestimar a capacidade da criança de entendimento do que é “ter” ou “não ter” limites.

   As resistências sempre existirão. Mas, as crianças são capazes de entender que há coisas que pode fazer e, outras, que não são permitidas.

   As crianças começam perceber as regras básicas a partir dos 3 anos, - no sentido do que é permitido e, também, no sentido amplo do que é “certo” e do que é “errado”.  Se houver resistência, é hora de entrar com a disciplina. Frustrar alguns dos desejos da criança é prepará-las para enfrentar os problemas sem muito sofrimento; é contribuir para o seu crescimento pessoal; é humanizá-la; é amá-la. E, poupá-las dessas dores é torná-las frágeis para enfrentar o novo, e, estar aberta às novas aprendizagens.   

       Apesar de a criança entender, ela tentará ultrapassar, transpor o limite, pois, entende também que querem tolher a independência que ela tanto deseja.

   A criança como o adulto quer conhecer o desconhecido, infringir as regras que não concorda, somente para se superar.          Os adultos também vivem tentando se superar. Porém, quando a criança deseja muito algo, ela é sedutora e, com toda a sedução que lhe é peculiar, sempre testará a autoridade daquele que cuida dela e, se apropriará das técnicas que já conhece para conseguir o que almeja.

     Precisamos entender também, que o termo “limite” tem outros significados.     Não deve ser pensado apenas como ponto extremo, como limitação, como fim. É comum a conotação negativa à palavra, pois, nos dá a ideia de restrição.    Se pensarmos como “fronteira”, não há dúvidas de que uma fronteira separa dois lados e, fica mais fácil na hora de disciplinar.

Disciplinar é mostrar para a criança ainda pequena, que, às vezes, precisamos permanecer de um lado só.  É mostrar que ultrapassar a fronteira quando não é permitido, é incorrer em consequências.     É convencê-la a permanecer no lado permitido. Mas, conseguir esse entendimento exige tempo, equilíbrio e muita paciência. É vê-la tentando infringir as “regras” o tempo todo e, ir apresentando as consequências.

   Se há receita pronta?  Não. Não há. É tão somente por meio dos bons exemplos e, da qualidade do tempo que dispomos com ela; é ter aquele olhar atento e uma “escuta” aguçada e, usar de criatividade todas as vezes que a criança exigir disciplina.

     Na escola, principalmente, “Limite”, muitas vezes, é confundido com “disciplina” pelo fato de seu emprego ser puramente restritivo.

  Estabelecer limites é diferente de “impor limites”. O limite é resultado da disciplina por consenso.

    Disciplinar é mostrar a criança ainda egocêntrica, por volta dos 3 anos e ½  a  4, que há outras pessoas a sua volta e, que essas pessoas são tão importantes quanto ela.  É mostrar a criança que do outro lado há regras, normas, limite entre o lado que ela está e o outro lado; conviver naquele espaço implica em obedecer as suas regras, leis ou normas.  Neste sentido, ela precisa escolher se quer permanecer do outro lado. Mas, o outro lado precisa ser convidativo e ter atrativos.

Podemos pensar que como a criança chegou depois, é ela que precisa se adaptar a dinâmica da família, da escola, e do meio social.

    A criança sempre chega como um convidado ilustre. Há preocupação com o espaço para recebê-la; com a forma como vamos recebê-la.  É sempre um grande evento a chegada de um novo ser. Tudo é preparado para que esse novo ser se sinta a vontade e confortável, porém, não se pode mudar tudo por conta de sua chegada, percebem? Há de se colocar horários, regras desde o início, pois isso é amar.

     A criança quando chega é dependente e alienada. O discurso da mãe a marcará. A forma como ela é recebida têm implicações na sua formação psíquica. Por isso, há crianças diferentes em diferentes contextos sociais. A concepção de infância é atravessada pela dimensão do espaço social e do tempo histórico em que o sujeito-criança está inserido.

   Essas dimensões produzem diferentes formas de “ser criança” e constroem uma subjetividade infantil relativa ao seu espaço particular e ao socialmente construído por seu grupo social.    Ao se aproximarem dos contextos sociais diferentes, dão-lhes novos significados, os reeditam e, reconstroem seus próprios espaços, criando suas diferentes histórias e geografias.

    A escola é um espaço social institucionalizado; é um lugar socialmente reservado para as crianças com os seus limites restritivos que devem ser respeitados. Porém, a educação de crianças pequenas, inclusive daquelas que ingressam no 1º. Ano, deve emergir em um campo educacional que busca construir sua própria identidade a partir das suas especificidades e necessidades.

   Acredito, assim como os psicólogos interacionistas  que é o meio social que nos molda em determinados cidadãos. “É na interação com o outro que o indivíduo se desenvolve, cresce e se humaniza” (Henri Wallon).     

      Na hora de lidar com os pequenos, os educadores (pais e professores) dispõem de algumas ferramentas que são imprescindíveis –  a “palavra” e, a “escuta”, olhar-observador” e, a “auto-avaliação”. É a partir desse “olhar-observador” que é possível verificar os êxitos e fracassos; interpretar o que vemos; formular juízos, julgar, analisar, verificar o que mais precisa ser feito, e qual a melhor forma de reprimir as ações indesejadas. É fazer uma auto-avaliação do que funciona para um grupo e, o que funciona para outro.

   Há sempre necessidade de um mínimo de repressão, mas, toda repressão só será útil quando for construtiva. Pois, todo conhecimento e consciência só são adquiridos quando despertamos emoção,  prazer, e curiosidade na criança.   Ensinar implica em provocar emoção no outro. Neste sentido, o outro aprende quando causamos alguma emoção nele. Pois, assim como Wallon, 1995, acredito que “a emoção causa impacto no outro e, tende a se propagar no meio social”.

    É certo que os pequenos necessitam de limites.   Os limites são um dos pilares para uma boa formação, que, além de educar, fornecem aquele sentimento de segurança física e emotiva de que a criança precisa. É no  estabelecimento de limites que vamos fornecendo as grandes lições de autocontrole e de comportamento ético à criança.

     Há comprovações de que as pessoas costumam ouvir mais e respeitar mais as pessoas que admiram que elas têm como modelo, e o segue pelo valor que atribui a essa pessoa. Isso é pensar na forma como afetamos o outro de nossas relações. Nós podemos afetar o outro de forma negativa ou positiva e ele vai responder de uma forma ou de outra. 

     Como você tem afetado as emoções dos seus pequenos?

                                          Maria Teixeira, professora (letras), pedagoga, psicopedagoga e mestre em psicologia da educação.