O subjetivismo do sujeito egocêntrico

Há uma fase do desenvolvimento infantil que é chamada de egocentrismo. Nessa fase, as crianças têm dificuldade de compartilhar brinquedos e outros objetos. Pode parecer, mas não se trata de uma atitude egoísta. As crianças nessa fase ainda não sabem coordenar seu ponto de vista com o do outro e estão construindo a idéia de propriedade, ou seja, precisam aprender a diferenciar o que é dela, o que é do outro e o que é de todos. Essa fase do desenvolvimento infantil é chamada de egocentrismo e, se refere a um pensamento realista centrado no ponto de vista da criança. Ela não conhece outras perspectivas diferentes das suas e acredita que todos ao seu redor percebem, sentem e pensam da mesma maneira, ou seja, o mundo gira em torno dela -, ela não consegue perceber o outro. Além disso, não vê necessidade de explicar aquilo que diz ou faz, porque acredita que será sempre compreendida e, tem dificuldade em lidar com frustrações porque percebe nada além do seu próprio desejo e sentimento. Para demonstrar sua insatisfação e ter suas vontades atendidas, elas podem fazer birra para chamar a atenção dos pais e professores, algumas delas podem até mesmo serem agressivas, melancólicas, se fazer de vítima diante das situações de conflito. Nesse processo, é importante os educadores (pais e professores) serem pacientes e mostrarem-se firmes nos argumentos. O objetivo é envolver a criança na resolução de seu conflito, para que futuramente ela possa fazer isso com independência. Ao promover essas intervenções permitiremos que as crianças construam sua identidade, reconheçam seu jeito de ser e, suas contradições em relação ao outro.  

  Hoje em dia, é muito comum encontrarmos crianças acima de 7 anos com uma lógica  ainda egocêntrica.   Aquele egocentrismo que é próprio da criança entre 2 - 4 anos.  São sujeitos que têm critérios particulares e individuais. No lugar social, na escola, por exemplo, tendem a ter problemas, pois,  se deparam com critérios e regras mais consistentes.

 A criança egocêntrica é aquela que se centra no se próprio ego: ego + centro, ou seja, centra-se em si mesmo. É aquela criança que considera que tudo "gira ao seu redor"; popularmente, "centrado no próprio "umbigo". 

    A pessoa que se forma e, permanece em uma estrutura egocêntrica está sempre preocupada com sua causa exclusiva ou principalmente com os próprios interesses e bem-estar, com pouca consideração pelos outros.  O egocêntrico é egoísta e, atrai a atenção das pessoas de forma negativa. É por isso que não existem nada nem ninguém além da pessoa egocêntrica, Os egocêntricos estão enamorados de símbolos de status, ou seja, objetos que fazem os outros olhar, admirar, invejar, sonhar, comparar ou se inspirar. O egocêntrico desfila suas possíveis qualidades, exibe-as, consome visivelmente sua prepotência.

   O sujeito egocêntrico adora ser elogiado em voz alta, chamando a atenção para si compulsivamente, gaba-se de seus feitos, mesmo quando realizados em equipe, ou seja, lhe dá destaque incessantemente.  Dizer que um sujeito é egocêntrico, é o mesmo que dizer que é egoísta, prepotente e, muitas vezes debochado, portanto, “ele é o cara”. Não se importa com os demais. Existem dois tipos de egocentrismo, um é aquele que se acha o centro de tudo, que é o autor de tudo; é o centro do universo e é melhor que todos, e, ninguém tem importância a não ser ele próprio. O outro perfil é voltado à realidade, é centro de tudo, é o autor de tudo, é o centro do universo, todos têm importância para ele como se fosse ele próprio, porque toda dor ou alegria que sente é egocêntrica, sente-se confuso mediante ao fato de ser o único ser em todo espaço ilimitado a ser o centro e, conhecedor de tudo, por achar-se uma sumidade. 

     Pais, por tudo isso, todo cuidado é pouco com os elogios. A criança é movida a elogios, mas, os exageros podem contribuir para a formação de sujeitos egocêntricos. Rotulá-los como “príncipes” e “princesas” é envaidecer demais o seu ego. 

    Elogiar o próprio filho, celebrar seus talentos, ficar feliz com seus acertos e se orgulhar de suas qualidades é uma das delícias de ser pai e mãe. Impossível não se envaidecer ao ver sua criança ou adolescente conquistando seus objetivos, ou se destacando em uma área na qual tenha interesse. No entanto, muitos pais, têm perdido a medida dessa alegria. Cobrem seus filhos de elogios constantemente e os tratam como se fossem perfeitos.

     Muitos pais fazem todas as vontades dos pequenos, deixam os a vontade para decidirem o que querem fazer, na ilusão de que a conduta fortalecerá sua auto-estima, independência, e, fará deles indivíduos corajosos e confiantes, é outro  engano. Os elogios sem critérios criam adultos frágeis e egocêntricos. Essa conduta vem criando gerações de "príncipes” e “princesas" cheios de si que, apesar de se verem como seres únicos e impecáveis, são, na verdade, frágeis e não estão preparados para enfrentarem as dificuldades; são sujeitos com dificuldade de relacionamento e, insensíveis às frustrações. Uma grande quantidade de filhos criados nessas condições passa agora pela adolescência e os resultados começam a ser vistos com mais clareza nos meios sociais, como é o caso da escola, e, na sociedade como um todo.  

  Devemos considerar a subjetividade de cada sujeito, porém, o egocêntrico cresce com o subjetivismo exagerado. O subjetivismo do sujeito egocêntrico pode ser notado no uso exagerado de verbos na primeira pessoa.

   A opinião do egocêntrico é sempre parcelada, baseia-se nas sensações do que captam e, na perspectiva de aparecer diante do grupo, afinal, outra característica comum a ele, é a de que tudo sabe.  Percebe-se nesse sujeito atitudes de superioridade, individualidade, centralidade, orgulho, porém se contradiz com muita freqüência na sua onipotência ingênua.

   Talvez por isso, a nossa cultura esteja marcada pela supremacia do individualismo evidenciado em um grande número de pessoas. O individualismo se manifesta na arbitrariedade que é uma atitude de poder, de julgamento, de superioridade, de centralidade e, de dominação, típico do sujeito egocêntrico.

     As queixas, as manifestações de falta de limites e aceitação das regras restritivas são próprias de uma geração de "príncipes” e “princesas" cheios de si, centrados apenas em si. Essa arbitrariedade na estrutura dos pequenos significa desobediência, rebeldia, falta de respeito; entra em crise valores éticos, sociais e, a ausência do bom senso e o respeito pela verdade.

   O sujeito individualista desvaloriza o bem comum, a justiça social, a compaixão, não sabe diferenciar o que é lei e o que é moral. E, ainda, isso pode levá-lo a ser um sujeito  ambicioso, ganancioso, que visará apenas o lucro e, o valor material vai sempre prevalecer ao valor moral.  É onde o “ter mais” vence o “ser mais” e, cresce a indiferença pelo outro que não tem as mesmas coisas.  

   O sujeito egocêntrico por ser individualista, muitas vezes, torna-se insensível, cego, escravo de cálculos e ambições.  Outra característica é de não se importar se os outros estão bem e, não se interessar em ser bom para os outros.

  Pais, os excessos de elogios e liberdade demais, podem ser prejudiciais para a formação humana do seu filho (a). Percebe-se que a falha na educação está sempre relacionada com o excesso de liberdade e falta de hierarquia na primeira infância (até 7 anos). 

    Há muitas espécies de liberdade. Podemos dizer que algumas crianças têm o mundo de menos, outras têm o mundo de mais. Mas, ao dizer que pode haver “de mais” de uma certa espécie de liberdade devo apressar-me a acrescentar que a única espécie de liberdade que considero indesejável é aquela que permite diminuir a liberdade do outro, em favor do próprio desejo -, o  achar que tudo pode e, que não há ninguém mais importante  do que eu mesmo.

   Os professores se queixam de que muitas crianças chegam á escola sem noção de valores básicos, sem aceitar as regras e, a “leis” da escola, logo, não respeitam a liberdade do outro. Percebe-se então, como a maior quantidade de liberdade de uns, pode privar a liberdade dos outros. É onde entra a lei dos "mais fortes" que é capaz de privar da liberdade dos "mais fracos". É nesse momento que a escola deve entrar com a lei, estabelecer os limites, mostrar a hierarquia para  diminuir a quantidade de liberdade dos sujeitos mais rebeldes, centrados somente em si. 

    A questão do estabelecimento de limites, sempre me remete ao modo de vida dos animais. Os animais, por exemplo, pode dispensar o governo, a educação obrigatória, o código de trânsito, as regras sociais, pois, para eles não há complicações, agem  por intuição e, tudo se resolve. Os animais gozam de um alto grau de liberdade; contudo, acredito que poucos homens civilizados prefeririam viver como eles vivem a viver no seio de uma comunidade mais organizada. A criança precisa entender desde cedo que na vida organizada, a liberdade é requisito indispensável para a obtenção de muitos de nossos desejos.  E, ainda, que a liberdade não constitua o total das coisas que socialmente desejamos, ela é necessária para a obtenção da maioria delas. Só não podemos correr o risco de exagerar na sua importância, e,  devemos saber a necessidade de  sua ponderação.

    A reflexão que deixo aos educadores (pais e professores) -, Como educar de forma democrática no sentido de fazer possível que a necessidade do limite seja assumida eticamente pela liberdade? Para Paulo Freire, “A liberdade amadurece no confronto com outras liberdades, na defesa de seus direitos em face das autoridade dos pais, educadores” (p.119 - Pedagogia da Autonomia). 

Fonte: Livro: Maria, Teixeira. Limites: Como lidar com os pequenos?